'Terra Santa', Jerusalém, Israel.
Há uma passagem na Sagrada Escritura que considero de beleza insondável. Moisés estava diante de uma sarça que ardia sem se consumir, quando ouviu o imperativo de Deus: “Retira as sandálias dos teus pés, porque este solo que pisas é santo” (Êxodo 3:5). Confesso que esse imperativo musicou meu coração...
Grandes perdas, grandes pedras; grandes aprendizados, grandes flores... Tenho contemplado os calvários da humanidade... Mulheres com os filhos mortos nos braços, gritando pelo sentido. Chorando a dor que não tem nome... A inversão brutal das regras da vida, o absurdo de ver partir antes do tempo a cria de suas carnes. Mulheres que reivindicam o direito de compreender o mistério da morte de seus inocentes... Mais uma vez eu me recordo de Drummond e seu sábio conselho: “Convive com os teus poemas antes de escrevê-los”.
Amigo, há acontecimentos que não combinam com explicações. E mesmo que explicações existissem não seriam capazes de aplacar a dor que provocaram. Nem sempre os claros e objetivos postulados da razão cartesiana conseguem resolver as questões humanas. Saber o porquê da morte não sana nem preenche a ausência sentida.
Tenho constatado que o discurso religioso, quando mal aplicado, pode ser tão nocivo quanto o discurso desumano dos assassinos. Escuto absurdos sobre Deus quando pessoas movidas por boas intenções resolvem explicar as fatalidades do mundo. Frases simplórias e descomprometidas com a verdade não resolvem, ao contrário, agravam ainda mais o sofrimento porque geram orfandade, descrença e abandono. Justificam as tragédias humanas como vontade Divina, retirando, assim, a responsabilidade humana dos acontecimentos, fruto das escolhas que fazemos. Respondem a tudo e a todos, como se o desvelamento do mistério pudesse resolver as questões.
Eu ainda prefiro o abraço solidário, o silêncio que nos permite proximidade e o comprometimento com a dor que me toca. Gosto de compreender as religiões como tentativas humanas de refazer a corda. Tenho medo quando o discurso religioso é usado para responder de forma mágica a questões que são humanas, sangradas no asfalto das cidades em lugares que os nossos olhos não alcançam.
Por isso não tenho receio em afirmar que o específico das religiões não consiste em responder as perguntas, mas em nos ensinar a conviver com elas. Na tentativa de resolver os conflitos que nos afligem, corremos o risco de atentar contra a sacralidade dos fatos. Dessa forma, deixamos de plantar as flores e insistimos em chorar sobre as pedras.
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